Superar a miséria no semiárido, mas com mobilização e transformação social!

Foto: Thiago Valentim/ CPT Ceará. Cisterna calçadão - Com. Quilombola do Veiga/Quixadá
por Thiago Valentim
CPT Ceará

Pegos de surpresa, todos nós que fazemos parte da grande família da ASA, as mais de duas mil entidades e todas as famílias beneficiárias dos programas P1MC e P1+2, soubemos da triste e revoltante notícia de que o Governo Dilma/MDS, romperia com a parceria com a ASA na execução de tais programas, passando a executá-los via Estados e Municípios.
Essa decisão arbitrária e autoritária interrompe todo um processo de mobilização e transformação social que a ASA vinha construindo, com grande êxito, com as famílias beneficiárias destes programas. Os Estados e Municípios, no entanto, não possuem a capacidade nem a boa vontade de realizar o mesmo processo, pois os interesses não são outros que assistencialistas e eleitoreiros.
As organizações que fazem parte da ASA não eram responsáveis somente pela construção das cisternas que, ao contrário das que o governo pretende fazer agora, de plástico, são de placas de cimento, tecnologia simples e barata, apropriadas ao semiárido e resistentes às mudanças climáticas. A ASA gerou e geriu um processo de mobilização social muito forte, participativo, transformador, questionador, alternativo de convivência com o semiárido, de cuidado com água, de garantia de direitos, de produção adequada e diversificada, com esforços de se tirar o chapéu, para além das possibilidades materiais e humanas das organizações, visando o empoderamento das famílias do semiárido na construção de alternativas e o protagonismo na luta pela efetivação de seus direitos.
A decisão, porém, de executar o programa via Estados e Municípios gera uma cadeia de problemas, tão antigos, mas que se renovam com esta decisão. Primeiramente, os Estados e Municípios não possuem a capacidade de gerenciar este programa nos moldes que a ASA construiu. Sabemos, em todo o semiárido, de políticos eleitos e, em época de eleição, de candidatos, que conseguiram recursos públicos para a construção de cisternas e foram distribuindo (o termo é esse, distribuição mesmo!), sem nenhum critério e, quando usaram algum, com certeza não foram aqueles critérios usados pela ASA, servindo-se das cisternas para a compra de votos e autopromoção. Conhecemos buracos cavados sem as devidas cisternas, cisternas construídas aleatórias e sem nenhuma preparação, rachadas em poucos dias, de promessas feitas e não cumpridas, gerando inúmeros conflitos nas comunidades. Interessante que essa decisão do governo foi anunciada nas vésperas de um ano eleitoral. Já podemos imaginar quem, de fato, serão os maiores beneficiários do programa a partir de agora.
Outro problema é a confecção de cisternas de PVC, não apropriadas ao semiárido, não resistentes, de cunho assistencialista, que causarão impactos ambientais, não havendo nenhum processo de mobilização social com as comunidades, nem cursos de GRH e tantos outros benefícios do processo construído pela ASA. Preocupante é o fato de que empresas se beneficiarão deste novo modelo, pois as cisternas de PVC custam o dobro das cisternas de placas construídas pela ASA. Podemos esperar desvios de verbas, superfaturamentos, morosidade na execução.
Apesar do governo afirmar que não está rompendo com a ASA e orientar de que a parceria seja feita com os Estados e Municípios, sabemos de todos os problemas e interesses em torno dos governos estaduais e municipais, contrários aos princípios da ASA, e que não se trata somente de transferir recursos às organizações da ASA para a execução do programa, mas o rompimento também se dá na mudança drástica de metodologia do processo até agora utilizado.
As entidades que compõem a Articulação do Semiárido Brasileiro são sérias e comprometidas com a construção de um semiárido vivo. E já deram provas disso em todos os processos de mobilização, gestão de recursos e execução das ações. A grande manifestação em Petrolina no último dia 20 expressou de maneira clara a nossa posição contrária à decisão do Governo Dilma e continuaremos resistindo para que a ASA continue executando os programas de convivência com o semiárido brasileiro.

21 de dezembro de 2011

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