CPT Ceará participa de audiências públicas sobre o Projeto Santa Quitéria de Mineração.
As discussões abordaram as falhas no EIA/RIMA para a exploração de minério.
Nos dias 20 a 22 de novembro, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA) promoveu três audiências públicas para discutir o EIA/Rima (Estudo de Impacto Ambiental / Relatório de Impacto sobre o Meio Ambiente) do Projeto Santa Quitéria, onde um consócio formado pelas empresas Indústrias Nucleares do Brasil (INB) e Galvani pretendem instalar um complexo minero-industrial para a mineração de urânio e fosfato, a conhecida Mina de Itataia. Se a mineração for concretizada, o urânio será utilizado para a produção de energia nuclear, contestada em todo o mundo e o fosfato para a produção de fertilizantes, para uso principalmente do agronegócio, que já causou vários impactos socioambientais em todo o Brasil.
No dia 20, a audiência pública aconteceu na
sede do município de Santa Quitéria, no dia 21, na sede do município de Itatira
e, no dia 22, no Distrito de Lagoa do Mato (em Itatira). Estiveram presentes
representantes do IBAMA, do Consórcio Santa Quitéria, da Empresa Arcadis Logos
- responsável pela elaboração do EIA/Rima -, pessoas de Caetité/BA,
representantes políticos locais e vários moradores de comunidades do entorno da
mina de Itataia. A Articulação Antinuclear do Ceará (AAN), formada pelo
Movimento dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais Sem Terra (MST), Comissão
Pastoral da Terra (CPT), Núcleo Trabalho, Meio Ambiente e Saúde para a
Sustentabilidade (TRAMAS/UFC) e Cáritas Diocesana de Sobral estiveram presentes
com vários membros, no objetivo de fazer o contraponto ao EIA/Rima e apoiar as
comunidades presentes na luta contra a concretização do projeto. Thiago
Valentim, coordenador regional da CPT Ceará esteve participando das duas audiências
no município de Itatira.
A discussão em torno da exploração desta mina
é antiga, desde a década de 70, quando a área foi adquirida pela união. Existe
uma preocupação enorme pelas populações do entorno com os impactos negativos
que esta mineração causará caso venha a ser concretizada. Contudo, na
apresentação do projeto feita pelo Consórcio, estes impactos estiveram
totalmente ausentes e, na apresentação do EIA/Rima pela Empresa Arcadis Logos,
alguns impactos negativos foram apresentados sem muita relevância. Isso
demonstra a falta de responsabilidade por parte dos empreendedores com o futuro
da região e até mesmo a omissão de informações importantes sobre o projeto.
O EIA/Rima possui quase 5.000 páginas,
caracterizando-se um documento muito extenso, com várias questões a serem
debatidas e impossíveis de serem feitas em apenas em três audiências. Por isso,
a Articulação Antinuclear do Ceará (AAN) defendeu que o EIA/Rima não deve ter
sua análise final pelo IBAMA sem que antes ocorra um amplo debate sobre o
projeto em outros municípios da região, como Madalena e Canindé. Estende-se
esse debate também para Fortaleza, local de onde o urânio será exportado para
outros países através do Porto do Mucuripe, analisando que os impactos nefastos
desta mineração irão para além dos municípios de Santa Quitéria e Itatira.
O Núcleo TRAMAS coordenou um Painel Acadêmico
Popular. Foram apresentados elementos que comprovam a insustentabilidade do projeto,
que demandará muita água em uma região semiárida (917,9m³ de água por hora, o
equivalente a 115 carros pipas por hora) e, causará além de poluição diversa
aos bens naturais, inúmeros casos de câncer. Foi apresentada, ainda, a problemática
do aumento de prostituição e uso de drogas na região por conta de migração de
pessoas, especialmente homens (baixar nota do TRAMAS/UFC).
Fonte: reprodução. |
Na audiência em Itatira, Thiago Valentim, da
CPT Ceará, denunciou a falta de compromisso de grande parte dos gestores
municipais, como prefeito e vereadores, em discutir com seriedade o projeto com
a população local. O descompromisso foi reforçado ao apontar a ausência da
audiência bem antes do seu término, em clara manifestação de adesão acrítica ao
projeto e falta de respeito com as pessoas da região, inclusive jovens. A comunidade
permaneceu na audiência, apesar da hora avançada, vindo esta a terminar às 02hs
da madrugada, depois de 08 horas de intensa discussão. Thiago afirmou ainda que
as populações locais não foram inseridas de forma ativa na discussão do projeto
até aquele momento, denunciando a forma com as empresas tratam as pessoas do local
e o tipo de informação disseminada entre as comunidades, sendo mentirosas e
omitindo pontos importantes sobre o empreendimento.
Moradores das comunidades do entorno e
lideranças de organizações locais expuseram suas preocupações em relação à água
e à produção da agricultura familiar, já que a experiência de Caetité/BA
comprova a contaminação das águas e a impossibilidade de venda no comércio
local de produtos da região do entorno da mina.
Impressionou o número de pessoas de Caetité
presente nas audiências levadas pela INB. Entre vereadores, representante do
Sindicato dos Mineradores de Brumado e Microrregião, inclui-se um agricultor
orientado a defender a empresa e apresentar melhorias na vida de sua família a
partir da atuação da mesma. Um sentimento que não é compartilhado pela maioria
dos moradores da região, como expressou Bene, agente da CPT BA em Caetité. Em
sua fala, o presidente do Sindicato dos Mineradores acusou os movimentos
sociais de serem manipuladores do povo e estarem contrários ao desenvolvimento
da região.
Entre as pessoas contra o projeto ou com
inúmeras preocupações, estão os moradores do entorno da mina, em mais de 42
comunidades - onde o estudo apresenta apenas 05 -, movimentos sociais,
associações e organismos pastorais. A favor do projeto estão os representantes
políticos locais e grande parte de comerciantes, o que demonstra uma clara
divisão de interesses em relação ao empreendimento. Enquanto os mais afetados
estão preocupados com sua qualidade de vida, saúde, modo de produção, o interesse
de outros é basicamente econômico.
A sensação, a partir das audiências, é de que
a luta ainda será longa. Como denunciou Lourdes Vicente, do MST, a arrogância
técnico-científica de representantes do IBAMA, da CNEN e do Consórcio, não se
preocupa com o bem-estar das populações, mas com números sem vida, estando por
trás interesses apenas financeiros do sistema capitalista. Pe. Ricardo, da
Diocese de Quixadá, deixou um último recado aos participantes: o urânio é um
minério mortífero, quando minerado em grande escala. Para além da produção de
energia nuclear, pode ser utilizado inclusive para a confecção de bombas
nucleares. O melhor é deixar o urânio no chão.
*Notícia enviada por Thiago Valentim, Coordenação Regional da CPT.
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