Mais terceirização, mais trabalho escravo
“O PL 4330 é uma grande ofensiva do capital para eliminar conquistas dos
trabalhadores”. Confira a entrevista que Rel-UITA fez com frei Xavier Plassat,
da coordenação da Campanha de Combate ao Trabalho Escravo da Comissão Pastoral
da Terra.
Numa estratégia da direita brasileira, da bancada ruralista e das
bancadas patronais, para criar um ambiente de liberação total, atacam-se as
legislações brasileiras protetoras dos direitos trabalhistas, ambientais e
históricos dos trabalhadores, quilombolas, indígenas e extrativistas. É nesse
ambiente que o PL 4330 ressurge, afetando profundamente o combate ao trabalho
escravo. Para conhecer mais sobre essa problemática, A Rel entrevistou Xavier
Plassat, coordenador do combate ao trabalho escravo da Comissão Pastoral da
Terra.
O que mais chama a sua atenção com relação ao
PL 4330?
Que este projeto, de um deputado de Goiás, Sandro Mabel (PMDB-GO), que
tinha caído no esquecimento, justo agora saia do esconderijo e avance em alta
velocidade! Isso não é por acaso, obviamente. É porque o PL 4330 entra numa estratégia onde
a direita brasileira, e não somente a bancada ruralista, mas também as bancadas
patronais, da construção civil, por exemplo, visam a criar um ambiente de
liberação total em relação à possibilidade de exploração do trabalhador. Com isso atacam as legislações brasileiras
protetoras dos direitos trabalhistas, ambientais e os históricos dos
quilombolas, dos indígenas, dos extrativistas, dos posseiros, buscando, por
exemplo, legitimar a invasão dos seus territórios, para o plantio de soja. Tudo
isso entra numa grande ofensiva do capital, para eliminar conquistas dos
trabalhadores.
A aprovação do PL 4330 causará um aumento no
número de trabalhadores escravos?
A aprovação do PL 4330 terá conseqüências amplas que não se limitam à
questão do trabalho escravo. Ele cerceará a legislação que protege o
trabalhador da exploração e, mais especificamente, do trabalho escravo.
Como assim?
A terceirização, sendo regida pelo lucro maior por todas as partes
empresariais envolvidas, levará à redução dos direitos e da remuneração do
próprio trabalhador. Não tem equação
matemática que possibilite outro resultado. Se dois empresários precisam lucrar
em lugar de um só, o tomador do serviço será terceirizado e este ainda irá
subempreitar. Poderão chegar a três
empresários querendo lucrar em cima da mesma obra, do mesmo serviço, da mesma
confecção, da mesma construção e é óbvio que o trabalhador final, realizador do
trabalho, receberá o que sobrar depois de cada empresário retirar o seu lucro. E o que se anuncia agora, com a liberação
total da terceirização, envolveria não somente as atividades meio mas também as
atividades fim. Temos, então, um campo
enorme aberto e ilimitado para as empresas usarem o sistema de terceirização
como quiserem, expondo os trabalhadores a muito mais riscos de degradação. Se amanhã esta degradação não significar mais
trabalho escravo, será a legalização da pura exploração.
Por que há esse vínculo entre a terceirização
e o trabalho escravo?
Primeiro pelo aspecto puramente financeiro. Quem subcontrata,
subempreita uma atividade, por exemplo, uma construtora que subempreita uma
parte da construção de tal conjunto habitacional, não deixará de querer lucrar
sobre essa parte que subempreitou. Então,
vamos chamar o lucro dela de A. A empresa que vai pegar o serviço também vai
querer lucrar. Vamos chamar o lucro dela de B. E se essa segunda empresa também
subempreita outra parte da obra, também vamos ter o lucro C, e o lucro D. É bem capaz que a soma dos lucros A, B, C e D
seja bem maior do que o lucro que a empresa inicial calculou obter quando fez a
proposta de licitação. Portanto, cada
empresa que entra na cadeia de produção quer garantir o seu próprio lucro. E a
empresa final, que contrata os trabalhadores, terá de pressionar ao máximo os
trabalhadores para garantir que o preço, aceito para garantir o lucro das
empresas que estão acima dela, seja realizado. Então, não há mecanismo possível a não ser a
exploração, seja por uma intensidade maior do trabalho ou o rebaixamento da
remuneração dos trabalhadores. Com isso,
abre-se um grande leque de riscos contra o trabalhador, sejam de segurança, de
condições de trabalho e da perda de direitos mínimos como alojamento,
alimentação e transporte. E temos aí
outro elemento, a diluição da responsabilidade. Quem realmente é responsável
por estes trabalhadores? O primeiro diz “ah, não! Eu entreguei o serviço para o
segundo”. O segundo vai dizer: “ah repassei esse serviço a um terceiro. Vai-se
gerar uma cascata de desvio de responsabilidades. E aí, quando a gente observa que dos 10
maiores resgates de trabalhadores no Brasil, entre 2010 e 2013, em 90% dos
flagrantes, os trabalhadores eram terceirizados, essa relação íntima,
intrínseca, entre trabalho escravo e terceirização fica evidenciada. PL 4330
& Trabalho escravo
O Par Perfeito para a máxima exploração
Há projetos no Senado que buscam retirar do
conceito de trabalho escravo qualquer referencia ou alusão às condições
degradantes e de jornada exaustiva. Se reduzirem o conceito de trabalho escravo
no Brasil, isso não cairá como uma luva
para o PL 4330?
As mudanças no conceito de trabalho escravo caem como luva com relação
ao PL 4330, e vice-versa. O que é muito grave! Porque nós estamos colocando o ferro
contra as populações mais vulneráveis, usando um argumento comum a todos esses
projetos de lei, onde dizem que o Brasil precisa de mais agilidade, mais
flexibilidade, mais terras, para poder lucrar, para reduzir o custo-Brasil,
para ampliar as terras exploradas e com isso ampliar o nosso PIB. E quem se
coloca contra esse argumento economicista, é atacado como se estivesse contra o
progresso. A mobilização da classe
trabalhadora através do movimento sindical devia ser muito mais violenta, não
no sentido do quebra-quebra, mas de criar uma outra relação de forças nas ruas
e nas fábricas, porque não podemos deixar que tomem de volta todos esses
direitos históricos que foram conquistados pela classe trabalhadora.
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